Algumas perguntas postas por Portugal Rádio CB, ao colega Vítor Reis, representante para Portugal da Federação Europeia da Banda do Cidadão - ECBF, sobre o estado actual da Banda do Cidadão em Portugal e a eventual criação de uma Federação Portuguesa de CB.

Estado actual da Banda do Cidadão

Portugal Rádio CB (PRCB) - Qual, ou quais as razões que, ao longo dos últimos anos, levaram, gradualmente, ao desaparecimento dos naturais utilizadores (cebeístas) da Banda do Cidadão, originando um vazio que tem sido, na maioria dos casos, muito mal ocupado?
Qual a falha havida no associativismo cebeísta para que a quase totalidade das suas organizações e respectivos dirigentes ficassem apáticos a esse esvaziamento, originando uma total inactividade das mesmas, transformando, salvo raríssimas excepções, grupos, clubes e associações da Banda do Cidadão em meras recordações dum passado distante?

Vítor Reis (VR) - A Banda do Cidadão, pelas suas características de meio de comunicação bidireccional, aberto e sem fronteiras, contém em si mesma uma forte componente social, pelo que é extremamente sensível às mudanças sociais que se têm verificado em todo o Mundo.
Nesse sentido, foram os anos das décadas de 70, 80 e início da década de 90, aqueles em que mais se reflectiu na Banda do Cidadão o espírito da comunicação em liberdade, ampla e responsável, fruto duma grande liberdade de espírito que se verificou em Portugal, na Europa e no Mundo, em sequência das grandes transformações sociais que os jovens impulsionaram a partir do movimento de Maio de 68, em Paris.
Também o associativismo, ligado sempre à ambição do Homem de Liberdade e de Comunicação, verificou nesta época um forte ressurgimento, com grande empenhamento dos dirigentes associativos.
Acontece que a partir de finais dos anos 80 um forte incremento no consumismo e na luta desenfreada pela preponderância individual, com a consequente competitividade desmedida entre as pessoas, levou ao isolamento e ao desinteresse na participação no colectivo. A utilização de meios tecnológicos, entretanto emergente e cada vez mais acessíveis, veio acentuar as dificuldades do associativismo, conduzindo à utilização da Banda do Cidadão de uma forma menos digna, muitas vezes para descarregar os problemas que cada um sente no seu dia-a-dia. Passou a conhecer-se o preço de tudo e o valor de nada.
As pessoas recolheram-se ao seu isolacionismo familiar, deixaram de ter participação associativa e de dar a sua contribuição voluntária e financeiramente desinteressada ao dirigismo associativo. As associações que são sempre o que os seus associados querem que sejam, definharam e desapareceram ou tornaram-se inactivas.

PRCB - O que levou a entidade da tutela, a agora – ANACOM (Autoridade Nacional das Comunicações), a deixar de vigiar e controlar as comunicações na faixa de frequência atribuída em Portugal, à Banda do Cidadão, apesar de estar regulamentada por Decreto-Lei e haver lugar à cobrança de uma taxa?

VR - A entidade da tutela, salvo os primeiros anos da legalização da Banda do Cidadão, digamos até meados dos anos 80, nunca praticou uma efectiva e correcta fiscalização à banda de frequências dos 11 metros. Actuava as mais das vezes em resultado de denúncias, a maior parte das quais resultantes de interferências nos equipamentos receptores do serviço de televisão. De resto a fiscalização tinha sempre por objectivo, primeiro, responder às reclamações de outros serviços, segundo, actuar coercivamente sobre os utilizadores da Banda do Cidadão. O objectivo da fiscalização da faixa atribuída à Banda do Cidadão nunca teve como objectivo proteger essa faixa, como se encontra consignado, antes, especialmente a partir de meados dos anos 80, criar um dossier de reclamações e deficientes utilizações que pudesse conduzir a cancelar a sua utilização, como era desejo da entidade da tutela da época.
Com a tutela dos serviços de televisão, especialmente após a entrada em funcionamento das televisões privadas, e dos serviços de móveis celulares, a entidade da tutela votou ao completo ostracismo o serviço da Banda do Cidadão.

PRCB - O Decreto-Lei 47/2000, Artigo 16º, pontos 1 e 2, diz-nos que a partir de 31 de Dezembro 2006 só podemos emitir com 1W em AM/FM e 4W em SSB, pois os licenciamentos antigos (5W AM e 12W SSB) e os actuais em FM (5W) terminam nessa data.
Esta medida foi só adoptada por Portugal, ou também vai vigorar nos restantes países europeus, onde as decisões e recomendações da Conferência Europeia das Administrações dos Correios e Telecomunicações (CEPT)?

VR - Desde a legalização da Banda do Cidadão que Portugal teve sempre a mais avançada e liberal legislação da Europa. A totalidade dos países europeus operavam em condições técnicas muito inferiores às que eram utilizadas no nosso país. Portugal serviu durante longos anos de exemplo para a luta de melhoria de condições desenvolvida noutros países e como bitola para o trabalho da Federação Europeia da Banda do Cidadão – ECBF junto das entidades europeias.
Refira-se, entretanto, que no seio da ECBF sempre se debateram duas correntes, no que concerne às normas de funcionamento da Banda do Cidadão.
Os países do sul da Europa, especialmente, Portugal, Espanha, França e Grécia, sempre defenderam uma norma com 40 canais (AM e SSB), com 4 e 12 watts respectivamente, enquanto a Alemanha e a Áustria defendiam, com o apoio de alguns fabricantes, uma norma de 40 canais em FM.
No âmbito da União Europeia foi inicialmente aprovada uma norma com o modo de modulação em FM. Posteriormente, fruto de um intenso trabalho desenvolvido pela ECBF junto da União Europeia, foi aprovada uma norma de 40 canais (AM e SSB) com 1 e 4 watts, respectivamente.
A ECBF mantém em aberto o dossier sobre o assunto, tendo apresentado documentação e justificação técnica para defender uma norma de 120 canais (AM, FM e SSB) com 4 watts (FM e AM) e 12 watts (SSB).

PRCB - Quais os contactos e/ou relações institucionais que a Federação Europeia da Banda do Cidadão mantêm com a Autoridade Nacional das Comunicações?

VR - A Federação Europeia da Banda do Cidadão – ECBF é membro de pleno direito do Instituto Europeu para a Normalização das Telecomunicações – ETSI, onde também têm assento os organismos normalizadores dos países europeus. Os delegados da ECBF mantêm contactos frequentes com os delegados do organismo normalizador português: ANACOM, por delegação do Instituto Português da Qualidade.
O representante em Portugal da ECBF mantém aberto com a ANACOM um canal de consulta e permuta de informação que é activado por delegação da ECBF.

Notas:

1. A CEPT – Conferência Europeia de Correios e Telecomunicações resulta da congregação das administrações postais dos países europeus, independentemente de pertencerem ou não à União Europeia, e não tem qualquer capacidade normalizadora ou legislativa, só podendo efectuar recomendações às administrações postais aderentes. O ETSI – Instituto Europeu para a Normalização das Telecomunicações é o organismo de normalização da União Europeia e, como tal, reúne no seu seio, não só as entidades normalizadoras nacionais, como também os representantes dos fabricantes e dos utilizadores.

2. Com o aumento do número de membros da União Europeia recentemente aprovado, estamos em crer que a capacidade negocial da ECBF aumentará, pois grande parte dos países do Leste europeu são defensores para a Banda do Cidadão de 40 canais, com AM e SSB e respectivamente 4 e 12 watts.

PRCB - Os nosso agradecimento pela disponibilidade e gentileza do colega Vítor Reis em responder às questões formuladas.

Setembro de 2004

Uma Federação da Banda do Cidadão em Portugal. Para quê?

Portugal Rádio CB (PRCB) - Victor Reis, fale-nos um pouco do movimento associativo cebeísta em Portugal, nos seus diversos níveis, clubes, federações, confederações.

Victor Reis (VR) – Em finais dos anos 70 e nos anos 80 do século passado houve uma grande explosão no associativismo cebeísta, daí que se tenham constituído legalmente largas dezenas de clubes, inclusive, com vocações diversas muito bem determinadas. Pela mesma razão e no sentido de melhor estruturar o funcionamento dos clubes foram constituídas federações regionais.

PRCB - Que tipo de clubes se constituíram nessa época?

VR – Além dos clubes que pretendiam associar os utilizadores da Banda do Cidadão deuma determinada região, que eram a maioria, alguns deles eram vocacionados para os cebeístas que praticavam contactos de longa distância, o DX e alguns outros vocacionados para actividades de rádio emergência.

PRCB – Há registo do primeiro clube cebeísta legalizado em Portugal?

VR – De acordo com os meus registos terá sido o Clube CB Açoreano, em 3 de Março de 1978, ainda no tempo da Banda do Cidadão ilegal em Portugal.

PRCB – E quanto às Federações?

VR – A Federação do Sul e Ilhas da Banda do Cidadão foi fundada em 22 de Novembro de 1982. A Federação de Clubes e Associações da Banda do Cidadão (Norte) foi fundada em 3 de Fevereiro de 1983. Em 14 de Fevereiro de 1987 realizou-se na Figueira da Foz uma reunião para legalização desta estrutura federativa que já funcionava há alguns anos, legalização que nunca se veio a concretizar.

PRCB – O relacionamento entre estas estruturas federativas era positivo?

VR – Na verdade houve sempre dificuldades de relacionamento estrutural, embora os seus dirigentes tivessem grande amizade entre si. As pressões regionais eram na verdade muito fortes.

PRCB – Foi possível conseguir institucionalizar uma estrutura nacional?

VR – Fizeram-se, na realidade, várias tentativas desde a realização do I Congresso Nacional da Banda do Cidadão realizado na Figueira da Foz, de 28 a 30 de Maio de 1982, sem que nunca se tivesse conseguido a sua concretização.

PRCB – Encontra alguma razão para esse facto?

VR – Sempre existiu grandes divergências entre as três estruturas federativas sendo difícil encontrar-se um consenso. Havia uma figura que durante algum tempo foi consensual para dirigir a estrutura nacional, embora com contestações pontuais, o que levou a que essa pessoa se dedicasse mais à organização europeia onde era bastante conceituado. Chegou a dirigir a área da Emergência Rádio CB a nível europeu.

PRCB – No momento actual o que pensa destas estruturas?

VR – Com a paragem da actividade da grande maioria dos clubes cebeístas as estruturas federativas perderam muito da sua razão de ser. Obviamente a nível nacional ainda menos se justifica.

PRCB - Como vê, então, o momento actual?

VR – O facto de existir em pleno funcionamento uma associação de implantação nacional, a Liga Portuguesa para a Defesa da Banda do Cidadão, sou da opinião que os clubes deveriam encontrar nessa entidade formas de coordenação das suas actividades.

PRCB – Pensa, então, que não se justifica a criação neste momento de uma estrutura nacional para a Banda do Cidadão?

VR – Como disse antes ela já existe. É a Liga Portuguesa para a Defesa da Banda do Cidadão. Então para que criar estruturas paralelas? Há, isso sim, que fortalecer a existente.

PRCB – Victor Reis, o nosso obrigado pelo seu depoimento.

VR – Disponham sempre inclusive, para esclarecimentos adicionais que os vossos leitores possam pretender.

Outubro de 2004

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